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FolhaPress

Alta de 139% em internações de gestantes acende alerta para recorde de mortes maternas por Covid

A suspeita é que, além do avanço da ômicron, a epidemia de H3N3 também seja responsável

Foto: Reprodução/ TV Brasil

As internações de gestantes e puérperas por Srag (Síndrome Respiratória Aguda Grave) voltaram a subir a partir do fim de dezembro no país, retomando os patamares de julho, após cinco meses de estabilidade.

Na última semana epidemiológica de dezembro, houve alta de 139% nas hospitalizações (de 147 para 351) em comparação ao mesmo período de novembro, antes do apagão da base de dados do Ministério da Saúde.

Se considerados apenas os casos confirmados de Srag por Covid-19, o aumento é de 62% (de 32 para 52). A suspeita é que, além do avanço da ômicron, a epidemia da gripe H3N2 também seja responsável por parte dessa alta, mas, por falta de testagem, não é possível saber o percentual.

Embora as internações por Srag tenham crescido em proporções semelhantes na população em geral, o aumento captado pelo OOBr (Observatório Obstétrico Brasileiro) a partir de dados do Ministério da Saúde, acende um outro alerta.

Ele ocorre em um momento em que o Brasil registra um recorde de mortes maternas, tornando praticamente impossível atingir uma meta global da ONU (Organização das Nações Unidas) de reduzir a taxa de mortalidade materna para 30 casos por 100 mil nascidos vivos até 2030.

Dados ainda preliminares mostram que de janeiro a setembro de 2021 o país registrou 2.450 mortes maternas, número 23% maior do que o registrado em 2020 e 42%, em 2019. Com isso, a taxa de mortalidade atingiu 123,4 por 100 mil nascidos vivos, índice comparado a países africanos e quatro vezes acima da meta global. Estima-se que 40% dessas mortes estejam relacionadas à Covid-19.

Antes da pandemia, o Brasil já estava com uma taxa ruim, de 55 mortes por 100 mil nascimentos. Com a crise sanitária, piorou ainda mais. “Foi um massacre de grávidas e puérperas, sem qualquer ação por parte da política pública, sequer uma campanha de vacinação para esse público tivemos”, afirma a médica epidemiologista Fátima Marinho, pesquisadora sênior da Vital Strategies e especialista no tema.

Embora estudos mostrem que a gestação e o pós-parto aumentam o risco de complicações e morte por Covid-19, tornando a letalidade ainda maior nesse grupo, no Brasil o alto número de óbitos maternos associados à doença é atribuído, principalmente, à falta de assistência adequada.

Desde o início da pandemia, uma em cada cinco gestantes e puérperas (22,6%) mortas por Covid não tiveram acesso à UTI e 33,3% não foram intubadas, último recurso terapêutico para os casos graves da Covid-19. Em 2020, um estudo colocou o Brasil como líder mundial de mortes maternas por Covid -entre a população geral, o país é o segundo com mais óbitos nos dados oficiais, atrás dos EUA.

Para a ginecologista e obstetra do Hospital das Clínicas, Rafaela Alkimin da Costa, uma das pesquisadoras do OOBr, os dados mostram claramente que a curva de hospitalizações voltou a crescer e que é preciso, mais do que nunca, atenção para freá-las e evitar mais mortes maternas.

Um estudo recente do OOBr mostra que gestantes e puérperas hospitalizadas sem nenhuma dose da vacina contra a Covid têm risco de morte por Srag 5,26 vezes maior do que daquelas com o ciclo completo de imunização.

Entre as gestantes e puérperas sem nenhuma dose, a taxa de letalidade, considerando apenas os casos graves, é de 14,6%. No grupo com ao menos uma dose, cai para 9,3%. Com as duas doses, reduz para 3,2%.

“Por ser uma vacina nova, esse grupo foi excluído nos primeiros meses da campanha de vacinação contra a Covid. Houve atraso na imunização e nenhuma política voltada para essas pessoas”, afirma Rafaela Costa.

Segundo a obstetra, devido ao apagão de dados no Ministério da Saúde ainda não há informações atualizadas sobre o percentual de gestantes atualmente vacinadas. Até outubro passado, apenas 4,3% das gestantes e puérperas internadas com Srag tinham tomado as duas doses da vacina.

“Quanto mais completo o esquema vacinal, mais evidente é a proteção. Tem que tomar a segunda dose e a dose de reforço também. Tem que manter distanciamento seguro, uso de máscara, higiene das mãos. A pandemia não acabou”, diz ela.

Ano passado, a morte por trombose de uma gestante no Rio de Janeiro após a vacinação contra a Covid e a disseminação de notícias falsas nas redes sobre a imunização, assustaram muitas gestantes e mães no pós-parto. Sem campanhas públicas de esclarecimento, os reflexos duram até hoje, segundo os especialistas.

No início de maio de 2021, o número de mortes de gestantes girava em torno de 65 semanais. A partir de agosto, quando a vacinação já estava estendida às gestantes sem comorbidades, o número de óbitos caiu para menos de dez por semana. Entre os finais de novembro e dezembro, foram computadas três mortes, mas ainda há dados atrasados devido ao apagão.

O impacto da epidemia de gripe sobre as grávidas também não está claro, segundo Rafaela da Costa. A grande maioria das internações por Srag nesse grupo tem agente etiológico desconhecido (72%). “A gente sabe que o influenza é um vírus muito agressivo em gestantes”, observa a médica.
Por isso, segundo ela, é muito importante que as gestantes também se vacinem contra a gripe influenza porque há evidências que a imunização confere proteção para as formas graves de Covid.

“Pode não ser o mesmo vírus, a resposta imunológica não ser a mesma, mas, de alguma forma, a vacina atua no sistema imunológico.”
Todas essas ações para proteger as gestantes e puérperas deveriam estar inseridas dentro de políticas públicas para evitar mais internações e mortes, segundo Fátima Marinho.

“É uma população de risco, deveriam ter sido organizados protocolos específicos de atendimento, sistemas de referência e contrareferência. Até a decisão de vaciná-las foi demorada. Essa postergação trouxe impacto na saúde dessas mulheres, mas ainda há muito o que fazer porque a pandemia continua aí.”

Por Cláudia Collucci

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