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Empresas suspeitas de elo com PCC transportam 840 mil passageiros por dia em SP

Elas não são, porém, as únicas companhias contra as quais pesam suspeitas

Duas operações realizadas pela Polícia Civil de São Paulo no intervalo de uma semana revelaram a suposta ligação de duas empresas de transporte público da capital com criminosos da facção PCC.

Elas não são, porém, as únicas companhias contra as quais pesam suspeitas.

De acordo com integrantes da Polícia Civil, do Ministério Público e do setor de transporte público ouvidos pela Folha de S.Paulo, ao menos outras duas empresas, com contratos com o município, são suspeitas de terem elos com a quadrilha. Somadas, elas são responsáveis pelo transporte de 840 mil passageiros ao dia na capital, segundo dados da SPTrans.

A UPBus, alvo de operação do Denarc (narcóticos) na semana passada, transporta diariamente cerca de 67 mil passageiros na zona leste e tem uma frota operacional de 138 ônibus. Segundo o delegado Fernando Santiago, responsável pela investigação, seis criminosos de relevo da facção estão entre os acionistas.

“Ela é do PCC, não há dúvidas disso”, diz o policial. “Mas eu tenho que ter a responsabilidade de não prejudicar o cidadão. Algumas medidas estou tomando, mas evitando que isso prejudique o transporte urbano. Eu poderia bloquear todos os bens da empresa, apreender os ônibus e a paralisar o serviço. Mas, aí, eu prejudico a população”, afirma o delegado.

Dois acionistas dessa empresa foram assassinados entre o final do ano passado e começo deste ano, o que provocou uma guerra interna no PCC. A polícia acredita que os homicídios não tenham ligação com o setor de transporte, mas com dívidas de dinheiro entre os envolvidos na disputa sangrenta que teve até esquartejamento de corpos e cabeça atirada em praça pública, na zona leste da capital.

Para especialistas em crime organizado, uma das formas para se perceber a presença da facção criminosa nas empresas de ônibus são os assassinatos envolvendo acionistas ou diretores.

Outra empresa alvo de operação da Polícia Civil é a Transunião, também da zona leste, suspeita de lavar de dinheiro para criminosos do PCC. A ex-cooperativa transporta cerca de 315 mil passageiros, em média, nos dias úteis e possui uma frota de 564 veículos, segundo dados da SPTrans.

Esse número de pessoas é superior à população de Limeira (SP), com seus 311 mil habitantes, segundo estimativa do IBGE para o ano de 2021.

Entre esses ônibus, conforme investigação policial, estavam 13 que eram do vereador da capital Senival Moura (PT). Os veículos foram entregues aos criminosos pelo parlamentar para não que fosse morto, segundo o diretor do Deic (departamento especializado no combate ao crime organizado), Fábio Pinheiro.

O parlamentar, líder da bancada do PT na Câmara Municipal, é apontado como integrante de esquema de lavagem de dinheiro do PCC e, ainda, ligado ao assassinato do ex-presidente da Transunião, Adauto Soares Jorge. O parlamente teve o pedido de prisão solicitado pela polícia, mas a Justiça negou a medida.

O vereador nega as acusações.
Em março de 2014, o irmão de Senival, o então deputado estadual Luiz Moura (PT), foi flagrado em uma reunião em que estavam presentes ao menos 13 integrantes da facção PCC, segundo informações da Polícia Civil à época, que monitorava o encontro em uma investigação para apurar ataques a ônibus.

O parlamentar alegou na época que estava lá para tratar de assuntos da categoria.
A reunião foi realizada na sede da Transcooper, da zona leste, atualmente chamada Pêssego. De acordo com a prefeitura, ela transporta 224 mil passageiros ao dia, em média, com uma frota de 454 coletivos.

A Polícia Civil de Embu das Artes, na Grande SP, investiga desde o final do mês passado um duplo homicídio de possíveis integrantes da Pêssego. Uma das principais linhas de investigação é a de que a dupla estava envolvida em desvios de recursos da empresa.

Em razão dessas suspeitas, as vítimas foram sequestradas na zona leste e levadas para a favela de Paraisópolis (zona sul). Lá, os dois teriam sido submetidos ao tribunal do crime do PCC e condenados à morte. Os corpos foram encontrados em um veículo abandonado em Embu.

Outra empresa com supostas ligações com o PCC é a empresa A2, ex-cooperativa que atua na zona sul da capital e transporta cerca de 238 mil passageiros por dia. Ela também entrou no radar dos policiais do Deic ainda em 2014, quando era investigada ligação do PCC com cooperativas e também com equipes de futebol.

O principal nome da A2 é Paulo Korek Farias, também presidente do Água Santa. Em 2006, ele foi investigado sob a suspeita de participar do plano do resgate de um preso. Tinha como parceiro o então presidente da Cooperpam, Luiz Carlos Pacheco, mas ambos acabaram absolvidos por falta de provas.

Farias também já foi investigado por porte ilegal de arma e, ainda, por ameaça e disparo de arma de fogo, mas todos os casos acabaram arquivados. “Nenhum diretor de cooperativa se envolveu com crime. Jamais”, disse em entrevista à Folha de S.Paulo em 2015.

No início do ano passado, o empresário José Antônio Guerino, 47, ligado à A2 e também à diretoria do Água Santa, foi morto com tiros de fuzil em um bar de Diadema (Grande SP). Na ocasião, a polícia informou que a vítima, com antecedentes criminais, era ligada ao PCC.

De acordo com o promotor Lincoln Gakiya, coordenador de força-tarefa Ministério Público para o combate ao crime organizado, integrantes da cúpula do PCC sempre usaram as empresas de ônibus para lavagem de dinheiro do narcotráfico e outros crimes.

“Isso é branquear dinheiro mesmo. Então, tem muito dinheiro que é oriundo do tráfico internacional e, para usar esse dinheiro, eles precisam das empresas para justificar a entrada de recursos na conta de familiares, aquisição de bens”, afirma o promotor.

Ainda segundo ele, a participação do crime no transporte público de São Paulo teve início na época do transporte irregular, no final dos anos 1990 e no começo dos anos 2000. Com a regulamentação do setor, eles ingressam no mercado de maneira decisiva nas empresas.

“Eles viram que é um ramo que facilita a corrupção e com volume de dinheiro em espécie que gira. Eles podem dizer que receberam muito dinheiro em moeda corrente, o que facilita a lavagem de dinheiro”, afirma Gakiya.
“Por isso você vê ex-diretores ou ex-donos que foram assinados porque os caras [da facção] se oferecem para comprar e, se não vende, acaba morto”, diz.

A reportagem entrou em contato com UPBus desde o começo da semana, mas, até a publicação deste texto, não havia recebido resposta. Outras empresas citadas na reportagem foram contatadas desde manhã de quinta (9), mas também não responderam.

O SPUrbanuss (Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo) também foi procurado pela reportagem para comentar o assunto. A entidade informou, porém, que as empresas investigadas por suposto envolvimento com o PCC não são filiadas ao sindicato, tendo associação própria.

A reportagem procurou, então, o presidente da Associação das Empresas de Mobilidade e Transporte Coletivo de São Paulo que aparece nos registros oficiais: Paulo Korek Farias, da A2. No primeiro momento, o empresário alegou desconhecer a existência da associação e, após a Folha de S.Paulo encaminhar os registros oficiais (apontando atividade de 2020), afirmou que desconhecia que ela havia sido oficializada.

Sobre o suposto envolvimento do PCC com as empresas de ônibus, incluindo a própria A2, o empresário disse, por telefone, que poderá comentar o assunto, mas prefere fazer isso pessoalmente. Afirmou que poderá conceder uma entrevista quando voltar de viagem, daqui a 20 dias.

Procurada, a Prefeitura de São Paulo informou que recebeu ofício da Polícia Civil informando que a investigação sobre a UPBus não afeta o resultado da licitação de concessão do serviço de transporte. “A SPTrans seguirá acompanhando o caso e irá colaborar com a polícia em tudo que for solicitado.”

“A SPTrans não foi informada a respeito do teor das investigações envolvendo as empresas A2, Pêssego e Transunião, entretanto, irá acompanhar o caso e colaborar com a polícia naquilo em que for solicitada”, diz trecho da nota enviada à reportagem na noite de quarta (8), antes da operação contra a Transunião.
“As empresas mencionadas são concessionárias operadoras do serviço de transporte público, após terem vencido processo licitatório público. Os contratos [são] válidos por 15 anos a partir de 2019”, finaliza.

Por Rogário Pagnan

 

 

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