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FolhaPress

Golpe da vacina com falsa enfermeira mirou também o Judiciário de MG

Conforme as declarações da falsa enfermeira à PF, as aplicações aconteceria em um casa no bairro Mangabeiras, de classe alta

Material apreendido pela PF, na residência de uma falsa enfermeira
Foto: Divulgação/PF

Além de empresários, o esquema da aplicação de suposta vacina contra Covid-19 por falsa enfermeira em Belo Horizonte pode ter tentado chegar também ao Poder Judiciário de Minas Gerais.

Em depoimento à Polícia Federal, que investiga o caso, a falsa enfermeira, Cláudia Mônica Pinheiro Torres de Freitas, afirmou que o nome do desembargador Nelson Missias de Morais, ex-presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) até o ano passado e integrante da 2a Câmara Criminal da Corte, estava em lista de pessoas que receberiam o que era tratado como imunizante contra a doença.

A aplicação, conforme as declarações da falsa enfermeira à PF, aconteceria em um casa no bairro Mangabeiras, de classe alta, na região sul da capital. A mulher afirma que esteve no local para o procedimento, mas o desembargador não compareceu. A falsa enfermeira disse ainda que advogados receberam nesta casa o que seria vacina contra Covid-19.

Por meio de nota divulgada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o ex-presidente da Corte afirmou que “não conhece e nunca teve qualquer contato com a mulher investigada por venda falsa de vacina”.

A nota diz ainda que o desembargador não mora no bairro Mangabeiras e, sim, no bairro de Lourdes, há mais de 20 anos.

“O magistrado sequer esteve no local onde ocorria a suposta aplicação da dose. Portanto, não há motivos para intimação ou depoimento do desembargador à Polícia Federal”, argumenta o texto enviado pelo tribunal à reportagem.

O advogado de Cláudia Mônica, Bruno Agostini, afirmou que não comenta o depoimento da cliente porque o processo corre sob segredo de justiça. Disse, porém, que sua cliente “esclareceu fatos” no interrogatório de junho.
Golpe As investigações da PF já apontaram que empresários de pelo menos dois setores, de transporte e de supermercados, contrataram o serviço da falsa enfermeira. Ao menos até o momento, as apurações apontam que o que era aplicado era soro fisiológico. O produto foi encontrado na casa da falsa enfermeira.

Claudia só foi descoberta depois de ser filmada por vizinhos de uma garagem de empresa de ônibus no bairro Caiçara, região noroeste de Belo Horizonte, aplicando injeções em pessoas que se encontravam dentro de carros.
A gravação foi feita em 22 de março. A empresa dona da garagem é a Coordenadas, ligada ao grupo Saritur, um dos maiores no setor de transporte de passageiros em Minas Gerais.

A partir dos vídeos a PF iniciou investigação. A falsa enfermeira foi presa no dia 30 de março e deixou a prisão em 9 de abril por habeas corpus. Claudia responde em liberdade por associação criminosa e falsificação, crimes que juntos podem dar 15 anos de prisão.

Transcrições de conversas de WhatsApp obtidas pelo jornal Folha de S.Paulo em abril, a partir do inquérito na Polícia Federal, mostram que familiares da falsa enfermeira também participavam do esquema.

Pelas conversas, o filho de Claudia, Igor Torres de Freitas, era o responsável por apresentar o que a mãe fazia a possíveis clientes. Em um dos trechos o filho da falsa enfermeira afirma estar tendo problemas com o banco em que movimentavam o dinheiro das aplicações, porque a gerente queria saber a origem dos recursos.

A falsa enfermeira cobrava R$ 600 por duas doses do que afirmava ser imunizante contra Covid-19. Entre as pessoas que pagaram pelos serviços da mulher estão familiares do ex-vice-governador de Minas Gerais e ex-senador Clésio Andrade, que já foi presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT).

O depoimento em que Claudia afirma que o desembargador do TJ estava em lista de pessoas que receberiam a suposta vacina ocorreu em 15 de junho. No anterior, dado quando foi presa, a falsa enfermeira permaneceu em silêncio.

Nas declarações de junho a falsa enfermeira diz ainda que não comandava a aplicação do que seria a vacina, e que foi contratada apenas para aplicar as injeções. A mulher aponta o empresário Marcelo Araújo, dono de haras, como quem organizou o esquema.

O advogado Juliano Brasileiro, que tem o empresário como cliente, afirma se tratar de mentira de Claudia Mônica e que espera a prisão da mulher. “Uma estratégia de defesa criminal deveria encontrar limites na lei e na ética. As mentiras contadas pela estelionatária não passam de invenção sem respaldo em prova e visam desviar o foco da investigação dos crimes por ela cometidos”, diz o advogado em nota.

Marcelo Araújo, segue o texto, “nega veementemente qualquer relação com a estelionatária e com a vacinação por ela empreendida, salvo o fato de ter sido por ela enganado, como tantas outras pessoas. Assim, aguarda confiante o esclarecimento dos fatos e a prisão da falsária”.

Troca A Polícia Civil de Minas Gerais poderá assumir as investigações sobre a falsa enfermeira suspeita de vacinação irregular em Belo Horizonte. O inquérito do possível golpe foi aberto pela Polícia Federal.

O Ministério Público Federal (MPF) no estado, no entanto, pediu à Justiça federal que as investigações sejam transferidas para a esfera estadual, caindo, portanto, a polícia civil, caso haja decisão favorável.

A justificativa do pedido de mudança é que “os possíveis crimes federais que estavam sendo investigados não se confirmaram”, afirma a Procuradoria.

Com a alegação de que se trata de processo sob sigilo, o MPF afirma que não pode dar outras informações sobre a ação, e não revela quais crimes federais avalia não terem sido configurados na investigação.

Uma das linhas de atuação da PF no caso envolvia a possibilidade de importação ilegal de vacinas contra a doença. Neste caso, a abertura da investigação é prerrogativa da Polícia Federal.

As polícias federal e civil não comentam a possibilidade de transferência das investigações. Os outros crimes investigados no inquérito são associação criminosa e falsificação.

Matéria escrita por Leonardo Augusto

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