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Idosos são maioria dos que desistiram do mercado de trabalho na pandemia

Desânimo com as oportunidades disponíveis para os mais velhos e incertezas sanitárias

Emanuel de Jesus Sousa Oliveira, 70, perdeu o emprego de faturista em uma clínica em novembro de 2021. O morador da capital paulista relata que até gostaria de voltar a prestar algum serviço para complementar a renda da aposentadoria, mas uma combinação de fatores travou a busca por vagas neste momento.

Desânimo com as oportunidades disponíveis para os mais velhos e incertezas sanitárias ainda relacionadas à pandemia fazem parte dessa lista.

“O mercado de trabalho para quem tem 60 anos ou mais é muito restrito. Achei melhor nem procurar nada no momento”, conta o aposentado, que trabalhava de casa no último emprego e teria interesse em ocupar outra vaga remota.

O caso de Oliveira não é isolado. Idosos formam a maioria dos brasileiros que saíram do mercado de trabalho durante a pandemia e não retornaram, indicam dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) compilados pela LCA Consultores.

O levantamento tem foco na população fora da força de trabalho. Esse grupo reúne pessoas de 14 anos ou mais que não estão ocupadas nem procurando emprego -formal ou informal.

No quarto trimestre de 2019, período pré-pandemia, a população fora da força somava quase 61,6 milhões de pessoas no país.

No primeiro trimestre de 2022, com a Covid-19 em curso, o grupo era em torno de 6% maior, estimado em 65,5 milhões.

Ou seja, houve acréscimo de quase 3,9 milhões de pessoas ao longo da crise sanitária. O número é mais elevado do que a população projetada pelo IBGE para um estado como Mato Grosso (3,6 milhões).

Os dados do instituto trazem recortes por idade e sinalizam que os trabalhadores com 60 anos ou mais puxaram esse crescimento.

Na faixa etária mais velha, a parcela que não estava trabalhando nem buscando emprego pulou de quase 22,4 milhões para 24,9 milhões entre o quarto trimestre de 2019 e os três meses iniciais de 2022.

O acréscimo foi de cerca de 2,6 milhões de pessoas, o equivalente a uma alta de 11,6%.

Também houve avanço nas duas camadas imediatamente anteriores durante a pandemia: de 40 a 59 anos (elevação de 9,4% ou 1,3 milhão a mais) e de 25 a 39 anos (aumento de 7,3% ou 628 mil pessoas a mais).

Segundo analistas, a renda obtida com aposentadorias é um dos fatores que explicam o fato de a população fora da força ser tradicionalmente maior entre os idosos. Mas, com os riscos associados à pandemia, a volta ao mercado ficou mais complicada para aqueles que desejavam complementar o rendimento.

É possível que uma parte não retorne à força de trabalho em definitivo, aponta o economista da LCA Consultores Bruno Imaizumi, responsável pelo levantamento.

“Esse movimento não é exclusivo do Brasil. A pandemia fez com que muitas pessoas repensassem a vida. O medo de pegar Covid pode ter feito com que parte dos idosos não voltasse para o mercado de trabalho”, diz.

“Além disso, ainda há um preconceito em relação a trabalhadores mais velhos preenchendo vagas”, acrescenta.

Descontente com o mercado de trabalho, Dionísio José da Silva, 72, conta que pediu para deixar a vaga de motorista em uma empresa em São Paulo em fevereiro deste ano.

Aposentado, ele afirma que precisaria fazer “algum biquinho” para complementar a renda. Porém, a busca por esse tipo de atividade foi afetada por motivos de saúde nos últimos meses.

Silva diz que foi infectado pelo coronavírus e também pegou pneumonia. “Isso atrasou o meu lado”, relata.

O economista Fábio Pesavento, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) em Porto Alegre, argumenta que parte das atividades econômicas que vêm gerando empregos no Brasil busca prioritariamente profissionais mais jovens. Ele cita o caso da construção civil.

O envelhecimento da população, acrescenta, também contribui para o aumento de idosos na parcela fora da força de trabalho.

“Aí surge um ponto importante: com a reforma da Previdência, as pessoas têm de trabalhar por mais tempo. Se ela não consegue uma ocupação, o que vai fazer?”, questiona.

Mulheres são maioria fora da força

A população fora da força de trabalho é formada majoritariamente por mulheres.

Às vésperas da pandemia, no quarto trimestre de 2019, a parcela feminina nessa situação era de quase 39,9 milhões. No primeiro trimestre de 2022, o número ficou em 42,3 milhões, uma alta de 6,1%.

Já o total de homens fora da força estava em 21,7 milhões no final de 2019. O contingente ficou em 23,1 milhões no início deste ano, um avanço de 6,6%.

A versão da Pnad com trimestres móveis até traz resultados mais recentes sobre o mercado de trabalho. Porém, não permite um detalhamento tão grande, o que é possível na pesquisa com trimestres tradicionais.

Na Pnad com trimestres móveis, a população de brasileiros fora da força de trabalho foi estimada em 64,8 milhões até maio deste ano, período mais recente com estatísticas disponíveis.

O resultado representa cerca de 2,8 milhões a mais do que no intervalo até fevereiro de 2020 (62 milhões), às vésperas da pandemia.

Na contramão, jovens ingressam no mercado Os dados do IBGE analisados por Imaizumi integram a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) com trimestres tradicionais -janeiro a março, abril a junho, julho a setembro e outubro a dezembro.

A pesquisa também mostra diferenças entre os trabalhadores mais velhos e os jovens. No segundo caso, a população fora da força já é menor do que no pré-pandemia.

O número de brasileiros de 14 a 17 anos sem trabalhar e sem procurar emprego teve redução de 325 mil pessoas entre o quarto trimestre de 2019 e o primeiro de 2022. A baixa foi de 3,2% (de 10,1 milhões para 9,8 milhões).

Na faixa de 18 a 24 anos, a queda foi de 3,7%. Houve saída de 267 mil pessoas da população fora da força, que recuou de 7,1 milhões para 6,9 milhões.

“A necessidade de recomposição da renda das famílias pode ter impactado. Mais jovens podem ter ido para o mercado por conta disso”, diz Imaizumi.

O economista Vitor Hugo Miro, professor da UFC (Universidade Federal do Ceará), vai na mesma linha.

“Mais jovens podem ter sentido a necessidade de complementar a renda. A gente vê aumento na taxa de participação deles”, afirma o professor.

A taxa de participação corresponde ao percentual de trabalhadores inseridos na força de trabalho (ocupados ou desempregados) em relação ao total de pessoas na mesma faixa etária.

Do quarto trimestre de 2019 para o primeiro de 2022, esse percentual aumentou de 18,7% para 19,4% na camada de 14 a 17 anos.

Enquanto isso, a taxa de participação caiu de 24% para 22% entre os mais velhos, com 60 anos ou mais. Os números também são da Pnad Contínua e foram compilados por Miro.

“Ter outra fonte de renda, como uma aposentadoria, ajuda a pessoa a não ter de procurar um emprego”, aponta.

Por Leonardo Vieceli 

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