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Justiça torna réus GCMs e ex-agente por atuação em milícia na ‘cracolândia’

Os quatro envolvidos foram denunciados por constituição de milícia privada, crime de concussão e lavagem de capitais. Elisson, Antonio e Renata estão presos

A Justiça de São Paulo aceitou a denúncia do Ministério Público e tornou réus guardas-civis municipais e ex-agentes por suspeita de integrarem uma milícia atuante na “cracolândia”, na região central de São Paulo.

Magistrado argumentou que denúncia já demonstra a materialidade do crime. “Suficientes indícios a atribuir autoria, perfazendo, assim, justa causa para a deflagração da ação”, escreveu o juiz Leonardo Valente Barreiros, em decisão proferida no dia 23 de agosto.Três guardas-civis municipais e um ex-agente se tornaram réus. São eles: Elisson de Assis (ex-GCM) e os demais agentes da ativa da Guarda Civil Metropolitana, Tiago Moreira da Silva, Antonio Carlos Amorim Oliveira e Renata Oliva de Freitas Scorsafava.

Os quatro envolvidos foram denunciados por constituição de milícia privada, crime de concussão e lavagem de capitais. Elisson, Antonio e Renata estão presos.

Segundo o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), os ex-agentes e GCMs formaram uma “milícia particular”. De acordo com o MP-SP, eles praticaram “crimes de concussão contra comerciantes da região central da cidade”.

Vendiam proteção aos comerciantes. De acordo com investigação do MP-SP, o grupo atuava junto ao PCC (Primeiro Comando da Capital) -inclusive os alertando sobre operações na região central de São Paulo.

Quem se negava a pagar não seria “protegido” pelos guardas. Para garantir que o comércio estaria seguro e sem a presença de usuários na fachada, os envolvidos cobravam a propina. Lojistas pagavam cerca de R$ 50 mil por mês. De acordo com o Fantástico, com informações do MP-SP, os acusados retiravam os usuários e os obrigavam a mudar para outra área de comércio, onde não pagavam o valor.

MP-SP ainda aponta para lavagem de dinheiro. Segundo a denúncia, agentes utilizavam laranjas, como parentes e empresas, para lavar o dinheiro oriundo das cobranças das “taxas de proteção”. A investigação indicou para dezenas de transações via PIX e até depósitos em dinheiro.

“[Os denunciados] exigiram, para si, direta ou indiretamente, em razão da função de guardas-civis metropolitanos, vantagem indevida consistente em “taxa de proteção” ou “segurança privada” de comerciantes da região central da cidade de São Paulo”, diz trecho do ofício do MP-SP.

Elisson de Assis negou envolvimento com os crimes investigados. Em depoimento à Polícia Civil, ele disse não ter envolvimento com “qualquer coação ou extorsão contra comerciantes ou qualquer pessoa para que estas fechassem contratos de prestação de serviço”. Ele afirmou ter uma empresa privada de segurança, prestando serviços a comerciantes e condomínios da região central, junto a outras três pessoas, durante as folgas.

COMÉRCIO ILEGAL DE ARMAS

Outros três guardas-civis municipais e dois ex-agentes também se tornaram réus por comércio ilegal de armas na região central da cidade. Os cinco envolvidos responderão por crime de organização criminosa e crime de comércio ilegal de arma de fogo. São eles: Rubens Alexandre Bezerra, Edno Sousa da Silva, Elias Silvestre da Silva, Ednaldo de Almeida Passos e Odair José Gonçalves Rodrigues.

Suspeito de chefiar o esquema, o GCM aposentado Rubens Alexandre Bezerra foi preso no dia 8 de agosto. A investigação indica que o armamento era repassado a mando dele para grupos criminosos. Rubens atuou como GCM entre 2003 e 2019. Ao Fantástico, a defesa de Rubens alegou que a acusação é inverídica e que “nada de ilegítimo foi encontrado na posse do acusado”.

Alvo de uma operação em março de 2023, Rubens Alexandre Bezerra tinha em seu celular mensagens contendo uma lista de pedidos de armas, segundo o MP. Segundo a apuração, ele negociava dispositivos com traficantes para que eles pudessem interceptar a frequência do rádio da PM e se antecipar às ações policiais. “Há ainda fotografias com diversos armamentos, alguns de grosso calibre, o que para além da gravidade do delito de comércio de arma de fogo, indica o poderio bélico do grupo, algo a sugerir tratar-se de fato de uma organização criminosa”, escreveu o magistrado.

“Os demais denunciados nesta peça que ora se examina também buscam contato com Rubens e conversam sobre compra e venda de armas de fogo, o que reforça a necessidade de recebimento da exordial também em face deles”< diz decisão do TJSP.
Elisson e Rubens chegaram a integrar a GCM, mas foram expulsos da corporação, respectivamente em 2019 e em janeiro deste ano.

O MP ainda vai seguir investigando o envolvimento de um policial civil e de outros 22 guardas civis metropolitanos com a milícia. Também pediu à Justiça o compartilhamento de provas com a Justiça Militar para que seja apurada a conduta de quatro PMs citados no inquérito.

A OPERAÇÃO
O Gaeco realizou na “cracolândia” uma operação para desestabilizar uma rede de crimes. Além dos guardas acusados por formação miliciana, criminosos associados ao PCC também foram alvos de 117 mandados de busca e apreensão em endereços na região central de São Paulo.

Durante a Operação Salus et Dignitas, ainda, foram cumpridos mandados de sequestro e bloqueio de bens e suspensão de dezenas de prédios comerciais na região central paulistana. Na ocasião, a gestão municipal alegou desconhecer qualquer milícia atuante em São Paulo envolvendo guardas-civis.

“Nós jogamos luz sobre o problema, a existência desse ecossistema criminoso. A maioria desses estabelecimentos não existe, do ponto de vista da regularidade fiscal, e faturam milhões. Então, toda essa estrutura acaba sendo ignorada”, disse Lincoln Gakiya, promotor de Justiça de SP.

“Os hotéis [no centro] seriam utilizados para traficância e o consumo de entorpecentes. No interior desses estabelecimentos, havia mulheres viciadas e submetidas a situações degradantes. Tudo isso sob o domínio dos antigos porteiros, que se filiaram ao crime organizado para gerenciarem o local e estabelecerem a ‘disciplina’ do Primeiro Comando da Capital”, diz trecho do documento do MP encaminhado à Justiça.

Por Eduarda Esteves, Josmar Jozino e Valmir Salaro

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