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FolhaPress

Quem é Oliveira Silveira, que lutou pela criação do Dia da Consciência Negra no Brasil

A rejeição ao 13 de maio surgiu de movimentos distintos

Cercada por papéis em um apartamento na zona norte de Porto Alegre, Naiara Silveira encontrou um caderno parcialmente danificado, mas legível. De 1960, “Contos da Água Boa” registra uma das primeiras incursões na literatura do escritor e intelectual gaúcho Oliveira Silveira, que há 50 anos reivindicou o 20 de novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares, como data de celebração da Consciência Negra no Brasil, em contraposição ao 13 de Maio.

“Ali pude ler algumas histórias que ouvi do meu pai ainda criança na fazenda onde ele nasceu”, diz Naiara a este jornal. “As impressões de um jovem que deixou Rosário do Sul, no interior do estado, aos 19 anos, sem dinheiro, para viver em Porto Alegre, vivenciando e relatando o choque entre o rural e o urbano.”

O texto inédito está entre os achados que a filha do poeta encontrou ao revirar o acervo do pai, intacto desde a sua morte, em 2009. A organização do material tem a ajuda de Sátira Machado, professora de literatura na Universidade Federal do Pampa e pesquisadora da obra de Oliveira Silveira.

“São documentos que iluminam não só a trajetória dele, mas do movimento negro no país”, afirma.
Os itens, que agora ocupam um antigo salão de festas na casa da pesquisadora, estão sendo catalogados.
O material será exposto no instituto em homenagem ao escritor recém-criado. A parte burocrática está resolvida. Falta uma sede. “Estamos em negociação com o poder público”, resume a filha do poeta.

A sanha dos cupins devorou alguns registros, mas grande parte está intacta. São poemas inéditos do autor de “Pelo Escuro”, de 1977, e “Roteiro dos Tantãs”, de 1981. Outro exemplo é o programa do Grupo Palmares, fundado por Oliveira Silveira ao lado de Antônio Carlos Côrtes, Ilmo Silva e Vilmar Nunes, para o evento que trouxe à tona a importância do 20 de novembro.

O encontro ocorrido em novembro de 1971, confundido com uma peça teatral por agentes da censura militar, teve entre as atividades a apresentação da pesquisa sobre o Quilombo dos Palmares e a leitura de textos de Castro Alves e Solano Trindade. “A partir desse dia, abriu-se uma perspectiva para entender e exaltar a riqueza do povo negro no Brasil”, comenta Machado.

A rejeição ao 13 de maio surgiu de movimentos distintos. Na transição do ensino médio para a faculdade de letras, onde estudou português e francês, Oliveira Silveira leu autores como o senegalês Léopold Sedar Senghor e o franco-caribenho Aimée Césaire, expoentes do movimento francês Négritude. Posteriormente, Silveira aprofundou a pesquisa sobre o Quilombo dos Palmares a partir dos livros de Edison Carneiro e Ernesto Ennes.

Essa amálgama fez com que Silveira, juntamente com seus pares, buscasse na história do Brasil datas que pudessem celebrar os negros para além da escravidão. Antes mesmo do evento sobre o 20 de novembro, o grupo Palmares celebrou ao longo de 1971 a trajetória de figuras como Luiz Gama e José do Patrocínio.

Mas foi a partir da reivindicação em torno de Zumbi e seu quilombo que a fagulha do 20 de novembro se espalhou pelo país. Entrevistas e artigos sobre o tema foram publicados na imprensa. Cartas do acervo de Oliveira Silveira mostram que a iniciativa teve a adesão e interesse de intelectuais como Abdias do Nascimento, Beatriz do Nascimento, Oswaldo de Camargo, entre outros.

A promoção da data também ganhou o apoio de organizações inseridas na luta contra o racismo, como o IPCN (Instituto de Pesquisas e Culturas Negras), o Cecan (Centro de Cultura e Arte Negra de São Paulo) e o MNU (Movimento Negro Unificado), lançado em julho de 1978. Em meio à ditadura, a atuação dos grupos em torno da luta racial foi observada de perto pelos militares.

A data da morte de Zumbi virou Dia da Consciência Negra apenas em 2011. Algumas capitais decretam feriado. Não é o caso de Porto Alegre. “A história começou aqui, em uma cidade onde o imaginário popular acredita não haver negros”, diz Naiara Silveira. “Fomos marginalizados pelo racismo estrutural. Trazer à tona o acervo do meu pai é uma forma de seguir reivindicando nosso espaço na história.”

Por Guilherme Henrique 

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