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Tratar de saúde mental nas escolas é uma forma de prevenir suicídios, diz psiquiatra

Psiquiatra afirma que ambiente escolar é um dos espaços mais eficazes e privilegiados para promover a saúde mental

Desde que as aulas presenciais foram retomadas no país, as escolas têm enfrentado uma série de problemas de saúde mental entres os estudantes. Tanto na rede públicas quanto na particular têm sido frequente o relato de depressão, ansiedade, automutilação e até mesmo suicídio entre os jovens.

Para o psiquiatra Rodrigo Bressan, o ambiente escolar é um dos espaços mais eficazes e privilegiados para promover a saúde mental. Ele avalia, porém, que o preconceito e falta de colaboração das famílias são um dos principais entraves para ações efetivas.

“A sociedade toda tem responsabilidade pela saúde mental das crianças e adolescentes. A escola é ao mesmo tempo o local em que esses problemas mais explodem, mas também onde há mais oportunidade de fazer um trabalho de prevenção”, diz Bressan, que é presidente do Instituto Ame Sua Mente, que trabalha com cursos de formação para professores sobre o tema.

“Infelizmente, a maioria das escolas ainda tratam o assunto de forma cosmética, sem tratá-lo da forma aprofundada e séria que seria o necessário”, completa o psiquiatra.

Bressan é também professor da Unifesp e do King’s College London, onde desenvolve pesquisas sobre a saúde mental de adolescentes. Ele avalia que a pandemia e o isolamento não são os responsáveis pelo aumento de transtornos mentais verificados pelas escolas, mas que eles trouxeram à tona questões que estavam escondidas.

Pergunta: As escolas têm relatado dificuldade para lidar com problemas de saúde mental entre os alunos. Qual é a responsabilidade delas diante dessa situação?

Rodrigo Bressan: Os transtornos mentais são muito frequentes: uma em cada quatro pessoas vai desenvolver um quadro ao longo da vida. E os primeiros sintomas começam cedo, hoje já temos informação suficiente para considerar os transtornos mentais como doenças crônicas da juventude.
Três em cada quatro adultos acometidos por doenças mentais começaram a apresentar sintomas antes dos 24 anos e metade deles antes dos 14 anos. Então, identificar cedo os sinais é a chave para evitar consequências mais graves, como o suicídio.

P.: A escola não é a única responsável por essa prevenção, mas é um dos espaços mais eficazes para isso, já que pode identificar os primeiros sintomas.
Como a escola pode identificar esses primeiros sintomas?

RB: O professor tem um olhar altamente privilegiado para identificar esses sintomas, já que eles olham o aluno longitudinalmente. Eles conseguem comparar o comportamento acadêmico e social do estudante em relação aos demais, algo que os pais dificilmente têm a oportunidade de fazer.

Por isso, a escola é um local muito importante para identificar sintomas de doenças mentais.

Quando digo que a escola pode identificar os primeiros sinais, não estou dizendo que ela deve fazer diagnósticos ou indicar tratamentos. Mas quero dizer que os professores precisam ter formação para saber como lidar com problemas que estão na sala de aula, qual encaminhamento dar para cada situação. Ter formação adequada para isso empodera o professor, facilita seu trabalho.

P.: Por que as escolas têm tanta dificuldade em lidar com o assunto?

RB: Por todo o estigma, preconceito e desconhecimento que temos na sociedade como um todo sobre a saúde mental. Quando eu não conheço algo, eu discrimino. Nós não formamos os professores para lidar com essas questões e precisamos urgentemente mudar isso.

As famílias também têm muito preconceito e desconhecimento e isso pode inibir as escolas de tratar sobre os temas. Muitas vezes as escolas acham melhor empurrar o problema para debaixo do tapete, achando que quem tem de resolver são os pais. E isso traz prejuízos para a sociedade toda, porque os transtornos acabam não sendo tratados.

Dados de um estudo, que conduzi com 2.500 jovens em São Paulo e Porto Alegre por mais de 10 anos com o Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento, mostram que 80% dos que tinham um transtorno mental não estavam em tratamento. O principal motivo para a falta de tratamento era o preconceito da família.

P.: As escolas devem abordar diretamente sobre suicídio? Como é possível preveni-lo?

RB: O suicídio é um fenômeno complexo e multicausal. No entanto, existe uma motivação comum em quase 90% dos casos: a existência de algum transtorno mental. Então, a melhor forma de prevenir o suicídio é tratar e falar sobre saúde mental.

Por isso, esse tema deve fazer parte do cotidiano da escola, mas de forma responsável. Não tratar de forma cosmética, como acontece na maioria delas hoje. É preciso treinar os professores, conversar com as famílias sobre o assunto.

A prevenção contra o suicídio não é falar sobre ele. Aliás, as pesquisas mostram que o efeito pode até ser o contrário. Estudos mostram, por exemplo, que a melhor prevenção para o uso precoce de álcool e drogas não é falar sobre as substâncias, mas trabalhar a saúde mental dos jovens. Eles mostram que falar sobre álcool e drogas pode até estimular o consumo.

P.: Muitos professores se queixam da sobrecarga do trabalho por terem que lidar mais com questões externas do que com o aprendizado dos alunos. Como tratar sobre esses assuntos sem sobrecarregá-los ainda mais?

RB: Quando vamos às escolas para os cursos de formação, os professores sempre se queixam dessa sobrecarga e entendo que ela existe. A maioria dos problemas da escola vem de fora e é ela quem tem de resolver.]

Mas formar professores para lidar com transtornos mentais os ajuda a encontrar soluções para problemas que já vivenciam hoje em sala de aula.

RAIO-X

Rodrigo Bressan, 54

É psiquiatra e neurocientista. É professor livre-docente do departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e professor visitante do King’s College London. É também presidente do Instituto Ame Sua Mente.

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Por Isabela Palhares

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