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FolhaPress

Mercado já vê inflação de 8% e ciclo mais longo de alta nos juros

Disparada de preços também joga mais pressão sobre o BC

Foto: Reprodução

Impactada por combustíveis e alimentos, a maior inflação para março em 28 anos fez o mercado financeiro elevar as projeções para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) no acumulado de 2022.

A disparada dos preços também joga mais pressão sobre o BC (Banco Central), que tende a ampliar o ciclo de alta na taxa básica de juros, a Selic, para tentar frear a carestia, avaliam analistas.

Em março, o IPCA registrou inflação de 1,62%, informou nesta sexta-feira (8) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Trata-se da maior alta para o mês desde 1994 (42,75%), antes da implantação do real.

O resultado veio bem acima da mediana das projeções do mercado. A expectativa era de inflação de 1,35%, de acordo com a agência Bloomberg.
No acumulado de 12 meses, o IPCA chegou a 11,30% até março. É o maior nível desde outubro de 2003 (13,98%) nessa base de comparação.

O mercado até espera uma perda de fôlego no acumulado e o retorno da inflação para um dígito até dezembro, em um contexto de juros mais altos, trégua nas contas de luz a partir da segunda metade de abril e alguma melhora no abastecimento de insumos.

Contudo, essa desaceleração encontra uma série de riscos pela frente e pode ser mais lenta do que a esperada inicialmente. Não à toa, as projeções para o IPCA estão sendo revisadas para cima.
A LCA Consultores, por exemplo, subiu nesta sexta a estimativa de inflação de 7,5% para 8% ao final de 2022.

“Entendemos que este resultado do IPCA de março mostrou pressões bastante disseminadas”, indicou a casa em relatório.
Já a Santander Asset deve aumentar sua estimativa de 7% para perto de 7,5%.

Em relatório, Eduardo Jarra, economista-chefe da Santander Asset, avalia que os dados de março indicam “mais cautela quanto ao processo de desinflação dos próximos meses, potencialmente mais lento e incerto do que o esperado anteriormente”.

O forte avanço de 1,62% foi puxado pela carestia dos combustíveis, especialmente da gasolina, e dos alimentos. No entanto, analistas enxergam pressões mais espalhadas entre os setores da economia.
Sinal disso é que o chamado índice de difusão ficou acima de 70% pelo quarto mês consecutivo, conforme o IBGE.

O indicador mede o percentual de bens e serviços com alta de preços, em uma amostra com 377 componentes.
Em março, a difusão subiu para 76,13%. É o nível mais intenso desde fevereiro de 2016 (77,21%). Na prática, o índice maior sinaliza que a inflação está mais disseminada pela economia.

“Há um espalhamento muito preocupante da inflação. Fica a dúvida se os juros em 12,75% ao ano serão suficientes para controlar o cenário. Acho que não. A gente deve ter uma alta adicional”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.

A Selic está em 11,75% ao ano. A partir de sinalizações dadas pelo BC, parte do mercado esperava que a taxa de juros subisse um ponto percentual em maio, para 12,75%, encerrando o ciclo de alta. Mas, com a inflação persistente, o aperto pode continuar em junho.

Por ora, a MB Associados projeta Selic de 13% ao final de 2022, mas não descarta uma taxa maior, de até 13,5%, conforme Vale.
Em relação ao IPCA, a consultoria manteve a previsão de alta de 7,8% no acumulado do ano. No entanto, uma inflação acima dos 8% até dezembro não está descartada, diz o economista.

“Há um grande risco de a inflação fechar acima dos 8%”, destaca Vale.
A Selic mais alta é uma arma do BC para tentar frear a demanda por produtos e serviços, em uma tentativa de atenuar os preços.

Também pode atrair mais recursos estrangeiros para o país, reduzindo a cotação do dólar e, consequentemente, a inflação. Analistas, contudo, chamam atenção para os riscos que permanecem no cenário.

COMBUSTÍVEIS E ALIMENTOS PUXAM ALTA
Em março, oito dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE tiveram alta de preços. A maior variação (3,02%) e o principal impacto (0,65 ponto percentual) foram dos transportes.

Na sequência, veio o grupo de alimentação e bebidas. O segmento teve alta de 2,42% e respondeu por 0,51 ponto percentual de impacto. Juntos, os dois grupos contribuíram com cerca de 72% do IPCA.

O resultado de transportes foi influenciado pela alta dos preços dos combustíveis (6,70%). O destaque veio da gasolina, que avançou 6,95%. Assim, foi o subitem com o maior peso individual (0,44 ponto percentual) no índice do mês.

A carestia dos combustíveis reflete o mega-aumento dos combustíveis promovido pela Petrobras em 11 de março. A estatal reajustou os preços da gasolina, do óleo diesel e do gás de cozinha devido à disparada do petróleo no mercado internacional. A commodity subiu na ocasião em razão dos reflexos da guerra entre Rússia e Ucrânia.

Já os alimentos, segundo o IBGE, ficaram mais caros com o clima adverso na largada do ano no Brasil.
Houve fortes chuvas no Sudeste e seca no Sul, o que afetou a produção e os preços. A pressão do diesel sobre os custos dos fretes é apontada como outra possível explicação para a carestia da comida.

Nesta sexta, a Necton Investimentos também revisou sua projeção para o IPCA de 2022. A alta prevista passou de 6,77% para 7,4%.

Segundo André Perfeito, economista-chefe da Necton, os dados de inflação de março reforçam a perspectiva de aperto monetário mais longo. A Selic deve subir para 12,75% em maio e, na sequência, alcançar pelo menos 13,25%, indicou Perfeito.

IPCA ‘COMPLICA’ COPOM, DIZ ANALISTA
Na visão de José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, o IPCA de março “complica” o Copom (Comitê de Política Monetária do BC).
“O Copom fica mais pressionado a prolongar o ciclo de alta da Selic. Nosso cenário já incluía a Selic em 13,25% até o fim do ano”, apontou relatório assinado pelo economista.

Já a Ativa Investimentos aumentou a projeção para o IPCA deste ano de 6,85% para 7,06%. A casa ainda revisou as expectativas para a inflação do próximo ano (de 3,8% para 4,1%) e de 2024 (de 3,1% para 3,2%).
O Itaú Unibanco elevou a projeção para o IPCA de 2022 de 6,5% para 7,5%, refletindo o maior repasse dos reajustes recentes de combustíveis, seus efeitos secundários e uma inflação de bens industriais mais prolongada.

“Incorporando maior inércia e persistência do processo inflacionário, revisamos a projeção para o próximo ano de 3,5% para 3,7%”, disse o banco em relatório. A instituição espera que o Copom continue subindo a taxa Selic até 13,75% ao ano.
O IPCA está em dois dígitos no acumulado de 12 meses desde setembro do ano passado. Assim, encontra-se distante da meta de inflação perseguida pelo BC.

Neste ano, o centro da medida de referência é de 3,50%. O teto é de 5%. Se as estimativas forem confirmadas, 2022 será o segundo ano consecutivo de descumprimento da meta.

Quando isso acontece, o presidente do BC tem de escrever uma carta explicando o avanço do IPCA acima do intervalo de referência.
Na quinta-feira (7), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, avaliou que a calibragem da política monetária no Brasil dependerá da extensão dos choques sobre a inflação.

Por Leonardo Vieceli 

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