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Inflação alta coloca em risco plano de Bolsonaro de Bolsa Família turbinado

O impacto da inflação sobre as contas públicas pode travar a ampliação do programa social

O forte aumento dos preços no país coloca em xeque a estratégia do governo para lançar um Bolsa Família turbinado no próximo ano.

O impacto da inflação sobre as contas públicas pode travar a ampliação do programa social mesmo se houver solução para o crescimento na conta de precatórios -dívidas do governo reconhecidas pela Justiça e sem possibilidade de recurso.

O projeto de Orçamento de 2022 foi elaborado ocupando todo o espaço do teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas. Portanto, aumentos na projeção de gastos precisam ser compensados com cortes em outras áreas.

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) quer um novo programa, chamado de Auxílio Brasil, com verba de aproximadamente R$ 18 bilhões acima do que o Bolsa Família tem atualmente.

Para isso, o governo espera que o Congresso autorize o parcelamento de uma parte de seus débitos judiciais. Com a medida, o Executivo pretende reduzir em R$ 33,5 bilhões a previsão de gastos no Orçamento de 2022.

A alta da inflação, porém, deve consumir boa parte desse dinheiro. Despesas públicas, como aposentadorias e pensões, são corrigidas pela inflação.

Para formular o projeto de Orçamento do próximo ano, o governo considerou que INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) será de 6,2% em 2021. A projeção é considerada defasada por integrantes do Ministério da Economia e também pelo mercado, que espera um resultado mais elevado -8%, segundo o último Boletim Focus, do Banco Central.

O Ibre FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas) calcula que o índice encerrará o ano em 9,1%. Nesse cenário, o projeto de Orçamento precisa ser ajustado, prevendo um aumento nos gastos do governo de quase R$ 23 bilhões.

Ou seja, da folga no Orçamento após o adiamento de precatórios sobrariam R$ 10,5 bilhões –menos do que o plano do governo para o novo programa social.

A previsão atual de recursos para o Auxílio Brasil no próximo ano é de R$ 34,7 bilhões. Mas o governo espera encontrar dinheiro para chegar próximo a R$ 53 bilhões.

Esse aumento é necessário para que Bolsonaro cumpra a promessa de elevar o benefício médio das famílias carentes de R$ 190 por mês para mais de R$ 300.

Além disso, sem a expansão da verba do programa social, não há recursos para que mais famílias sejam atendidas pela transferência de renda. Com isso, o Auxílio Brasil seria, na prática, uma réplica do Bolsa Família com nome diferente.

Pelos cálculos da equipe econômica, para cada 0,1 ponto percentual de aumento no INPC, o governo terá um gasto adicional de R$ 790 milhões em 2022. Isso ocorre por causa da vinculação de despesas como benefícios sociais e previdenciários, atrelados à inflação.

Além dos gastos na área social, o presidente Bolsonaro espera usar o espaço nas contas para outras medidas populares em ano eleitoral, como reajuste para servidores públicos e para ampliação de verba para obras públicas.

Portanto, a aceleração da inflação compromete a expectativa do governo para conseguir um alívio no Orçamento cujo objetivo é conseguir dinheiro para gastos com viés eleitoral.
Para Juliana Damasceno, economista e pesquisadora de finanças públicas do Ibre FGV, o projeto de Orçamento foi apresentado com base em números “sabidamente defasados” e a atual crise gera efeitos sobre a inflação.

“Temos que chamar a atenção para o cenário de incertezas políticas e também para questões de gestão, como na crise hídrica. Além disso, a crise de confiança já se reflete no câmbio”, afirmou.

O PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2022 foi apresentado pelo governo com previsão de gasto integral de R$ 89 bilhões para os precatórios. Para isso, o texto limitou as verbas para obras e deixou inalterados os recursos do Bolsa Família (R$ 34,7 bilhões), sem o aumento planejado pelo governo para o novo programa (verba de R$ 53 bilhões).

Mesmo com a utilização de parâmetros econômicos defasados, as contas apresentadas pela equipe econômica para o ano que vem estão comprimidas, no limite do teto de gastos.

Isso significa que se não houver solução para os precatórios, o salto na inflação poderá obrigar o governo a cortar R$ 23 bilhões em verbas previstas para os ministérios em 2022.

Com os gastos comprimidos, além de faltar verba para o Auxílio Brasil, uma limitação dessa magnitude nas contas poderia inviabilizar o funcionamento da máquina pública.

Diante da resistência do Congresso ao parcelamento dos precatórios, o governo vinha buscando uma solução alternativa, coordenada pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux.

O plano era viabilizar uma modulação desses pagamentos pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), sem a necessidade de aprovação do Congresso. A medida abriria uma margem de R$ 49 bilhões no Orçamento de 2022, espaço suficiente para turbinar o Bolsa Família e implementar outras ações.

No entanto, após sugestões golpistas e ataques à Corte feitos por Bolsonaro no sete de setembro, membros do governo passaram a considerar mais difícil essa solução por meio do Judiciário.

Ainda assim, técnicos esperam que o indicativo de moderação dado pelo presidente abra espaço para negociação. Novas reuniões sobre o tema estão programadas para esta semana.

Por Thiago Resende e Bernardo Caram

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