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FolhaPress

PF conclui apuração e imputa crimes a Bolsonaro por fake news em caso de vacina

Relatório final da investigação foi enviado ao STF a menos de dez dias de Bolsonaro concluir o mandato

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A Polícia Federal concluiu que Jair Bolsonaro (PL) atentou contra a paz pública ao disseminar notícia falsa que relacionava a vacina contra a Covid-19 ao risco de se contrair Aids, além de incitar a prática de crime ao estimular as pessoas a não usarem máscara de proteção.

O relatório final da investigação foi enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) a menos de dez dias de Bolsonaro concluir o mandato. O relator do inquérito é o ministro Alexandre de Moraes.

“Jair Messias Bolsonaro, de forma direta, voluntária e consciente, disseminou as desinformações produzidas por Mauro Cesar Barbosa Cid, em sua ‘live’ semanal no dia 21 de outubro de 2021, causando verdadeiro potencial de provocar alarma junto aos espectadores”, afirmou a PF.

No documento enviado a Moraes, a polícia afirmou que o conjunto de informações coletados ao longo da apuração permitiram identificar a ocorrência de manipulações e distorções de conteúdo de publicações que serviram de base para os temas propagados por Bolsonaro.

De acordo com a delegada Lorena Lima Nascimento, o mandatário causou “verdadeiro potencial de provocar alarma junto aos expectadores [da live], ao propagar a desinformação de que os ‘totalmente vacinados contra a Covid-19’ estariam ‘desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido que o previsto’, e que essa informação teria sido extraída de ‘relatórios do governo do Reino Unido'”.

Por tal conduta, a PF entendeu que Bolsonaro atentou contra a paz pública.

Quanto à segunda imputação, a de incitação à prática de crime, a polícia concluiu que o presidente disseminou desinformação de que vítimas da gripe espanhola teriam morrido em decorrência de pneumonia causada pelo uso de máscara e, com isso, teria “incutindo na mente dos espectadores um verdadeiro desestímulo ao seu uso [da máscara] no combate à Covid-19”.

As infrações criminais estão previstas na Lei de Contravenções Penais (atentar contra a paz pública) e no Código Penal (incitar a prática de crime).

Procurado para falar sobre as conclusões da PF, o Palácio do Planalto ainda não se manifestou.

A polícia deixou de enquadrar o mandatário formalmente nos dois delitos em respeito ao entendimento do Supremo de que pessoas com prerrogativa de foro no tribunal somente poderão ser indiciadas mediante prévia autorização.

Em relatório parcial em agosto, a PF já havia informado ao STF a existência de indícios de que o presidente e seu ajudante de ordens cometeram crimes na transmissão ao vivo.

A delegada encarregada do caso registrou que Bolsonaro foi intimado a apresentar sua versão sobre os fatos por intermédio da Advocacia-Geral da União.

Ele não se manifestou, e a “inércia” foi “entendida como exercício de seu direito constitucional de permanecer calado”. Não houve prejuízo à elucidação dos fatos, avaliou a PF.

O inquérito sobre o caso foi aberto por Moraes em dezembro de 2021, atendendo a um pedido da CPI da Covid do Senado.

“Não há dúvidas de que as condutas noticiadas do presidente da República, no sentido de propagação de notícias fraudulentas acerca da vacinação contra a Covid, utilizam-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, revelando-se imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados”, afirmou o ministro à época.

Considerado o braço direito de Bolsonaro e um dos seus principais conselheiros, o ajudante de ordens Mauro Cid foi indiciado pela polícia nos dois delitos. Cid é tenente-coronel do Exército.

“Mauro Cesar Barbosa Cid teria, de forma direta, voluntária e consciente, produzido textos inverídicos, a partir de material coletado na rede mundial de computadores, desvirtuando os conteúdos constantes das fontes de informação por ele utilizadas, com vistas a serem divulgados pelo presidente da República em sua live semanal”, concluiu a apuração.

A PF destacou que o ajudante de ordens, nos esclarecimentos prestados nos autos do inquérito, demonstrou “descaso” quanto à produção das desinformações que serviram de base para realização da live presidencial e ao sustentar a “impossibilidade de ser criminalizada a ‘liberdade de opinião’ do presidente”.

“Ocorre que não se tratou de uma mera opinião, conforme defendido por Mauro Cid, mas sim de uma opinião de um chefe de Estado, propagada com base em manipulação falsa de publicações existentes nas redes sociais, opinião essa que, por ter a convicção de que atingiria um número expressivo de espectadores, intencionalmente, potencialmente promoveu alarma”, disse a delegada.

Além do caso das vacinas, Cid ainda é alvo de outras investigações relatadas pelo ministro Alexandre de Moraes, como a do vazamento do inquérito do ataque hacker ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e a que apura a existência de milícias digitais.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, Cid teve o sigilo bancário quebrado após a PF encontrar indícios de transações suspeitas em suas movimentações financeiras.

Conversas por escrito, fotos e áudios amealhadas pelos investigadores por meio da quebra do seu sigilo telemático sugerem a existência de depósitos fracionados e saques em dinheiro em sua conta.

O material analisado pela PF indica que as movimentações financeiras se destinavam a pagar contas pessoais da família presidencial e também de pessoas próximas da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Por Marcelo Rocha e Fabio Serapião

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